É comum pensar que alguns minutos a menos de sono não façam diferença, mas pesquisas recentes mostram que, durante a adolescência, até mesmo pequenas variações no horário de dormir podem afetar o desenvolvimento cerebral e as habilidades cognitivas.
Cientistas do Reino Unido e da China constataram que adolescentes que vão para a cama mais cedo e dormem por mais tempo apresentam melhor funcionamento cerebral e se saem melhor em testes cognitivos. Esses resultados foram obtidos a partir de um grande projeto que acompanha a saúde e o desenvolvimento do cérebro de crianças ao longo dos anos.
O trabalho reforça estudos anteriores que já apontavam a relação entre hábitos de sono saudáveis e maior capacidade de concentração, memória mais eficiente e saúde mental fortalecida, mas também chama atenção para um dado preocupante: mesmo os adolescentes com melhores padrões de sono não atingiram o número de horas de descanso recomendado para a faixa etária.
O sono não é apenas um intervalo para o corpo descansar. Durante esse período, o cérebro elimina toxinas, organiza memórias e elimina conexões fracas para fortalecer as mais importantes, processo essencial para a aprendizagem, a solução de problemas e a criatividade.
Além disso, o sono profundo fortalece o sistema imunológico e ajuda a estabilizar o humor. Entretanto, na adolescência, o padrão natural de sono sofre mudanças: os jovens tendem a dormir mais tarde, acordar mais cedo e reduzir o tempo total de descanso, o que representa um problema para cérebros que ainda estão em rápida transformação. A recomendação é que adolescentes entre 13 e 18 anos durmam de 8 a 10 horas por noite, meta que a maioria não alcança.
A professora Barbara Sahakian, do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Cambridge, explica que dormir bem é crucial para o bom funcionamento do organismo, mas ainda se sabe pouco sobre o impacto do sono na adolescência, mesmo sendo esse um período determinante para o desenvolvimento humano. Pesquisas anteriores geralmente se baseavam em diários de sono relatados pelos próprios adolescentes, mas esse método é falho.
Neste estudo, mais de 3.200 jovens entre 11 e 12 anos usaram pulseiras inteligentes para monitorar o sono, e os dados foram comparados a exames de imagem do cérebro e testes cognitivos que avaliavam vocabulário, leitura, raciocínio e atenção. Para validar os resultados, a análise foi replicada com outros dois grupos de 13 a 14 anos, somando cerca de 1.190 participantes.
Os pesquisadores identificaram três padrões principais de sono. O primeiro grupo, que representou 39% da amostra, dormia em média 7 horas e 10 minutos, ia para a cama mais tarde e acordava mais cedo. O segundo grupo, 24% dos adolescentes, dormia em média 7 horas e 21 minutos, com horários intermediários. O terceiro grupo, formado por 37% dos jovens, registrou média de 7 horas e 25 minutos de sono, deitava-se mais cedo, adormecia rapidamente e apresentava batimentos cardíacos mais baixos durante a noite, sinal de melhor qualidade de descanso.
Nos testes cognitivos, esse terceiro grupo obteve os melhores resultados, seguido pelo segundo, enquanto o primeiro ficou em último lugar. Os exames de imagem mostraram um padrão semelhante: os que dormiam mais cedo e tinham sono mais profundo apresentavam maior volume cerebral e melhor desempenho, enquanto os que dormiam menos apresentavam volume reduzido e desempenho inferior.
Embora a diferença entre os grupos fosse de apenas 15 minutos na média de horas dormidas, os efeitos sobre o cérebro e os testes foram significativos, reforçando a importância de noites bem dormidas nessa fase da vida.
A pesquisadora Qing Ma, primeira autora do estudo, destacou que os achados confirmam pesquisas anteriores sobre o papel do sono na consolidação da memória, processo em que o cérebro fortalece e estabiliza informações recém-aprendidas, fundamental para o desempenho escolar e o raciocínio cotidiano.
Os dados sobre frequência cardíaca também trouxeram pistas importantes: os adolescentes do terceiro grupo, com sono mais tranquilo, apresentavam níveis mais baixos, enquanto os do primeiro grupo registraram batimentos mais altos, associados a sono agitado, despertares frequentes e maior fadiga durante o dia.
Por se tratar de uma pesquisa de longo prazo, os cientistas puderam observar que essas diferenças em padrões de sono, tamanho cerebral e desempenho cognitivo aparecem de forma consistente ao longo de anos, sugerindo que os efeitos podem ser duradouros. A questão seguinte é entender por que alguns adolescentes dormem menos e vão para a cama mais tarde.
O pesquisador Wei Cheng, da Universidade de Fudan, aponta possíveis fatores, como o uso excessivo de telas à noite, videogames ou variações naturais no relógio biológico. Embora o estudo não comprove causa e efeito, a associação entre dormir mais cedo, descansar por mais tempo e apresentar melhor saúde cerebral é forte o suficiente para orientar pais, professores e os próprios jovens a adotarem hábitos mais saudáveis.
Especialistas recomendam estabelecer horários regulares para dormir, reduzir o tempo diante de telas na hora anterior ao sono, manter o quarto silencioso, escuro e fresco, evitar cafeína e cortar cochilos tardios. Ainda que pequenas, essas mudanças podem representar ganhos expressivos, já que a pesquisa mostra que até 15 minutos a mais de descanso podem gerar diferenças perceptíveis no cérebro e no desempenho cognitivo.
Fica claro que, na adolescência, o sono vai muito além do descanso: ele é peça fundamental para o equilíbrio emocional, a saúde mental, o aprendizado e a qualidade de vida. Às vezes, a distância entre uma mente comum e uma excepcional pode ser apenas um quarto de hora a mais de sono.
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