Os livros didáticos de ciência geralmente descrevem os humanos como possuindo cinco sentidos: visão, olfato, audição, paladar e tato. Embora esses sejam, de fato, os sentidos mais evidentes e reconhecíveis, eles estão longe de ser os únicos. Um exemplo é a propriocepção, que é a capacidade do corpo de perceber sua posição e movimento no espaço. Pode parecer algo simples, mas viver sem essa percepção traz sérios problemas, sendo o desequilíbrio corporal apenas o começo.
Agora, uma nova pesquisa sugere a existência de mais um sentido, dessa vez relacionado ao intestino. É ali que reside o microbioma, um conjunto de bactérias, fungos, vírus e arqueias que influenciam diretamente o sistema imunológico, a digestão e até a saúde mental. No interior desse ecossistema microbiano, estruturas semelhantes a caudas chamadas flagelos, usadas pelas bactérias para se locomover, liberam uma proteína ancestral conhecida como flagelina. Segundo o estudo, essa proteína é usada por neurônios presentes no intestino, chamados neuropódios, para regular o apetite.
Os cientistas descobriram que os neuropódios contêm um receptor chamado TLR5 (receptor toll-like 5), responsável por enviar sinais ao cérebro através do nervo vago, que é a principal via de comunicação entre o intestino e o sistema nervoso central, além de ser o nervo mais longo do sistema nervoso autônomo. Isso mostra como os microrganismos que habitam nosso intestino conseguem estabelecer uma comunicação direta com o cérebro humano.
Diego Bohórquez, autor principal do estudo, declarou em nota que a equipe estava curiosa para saber se o corpo seria capaz de perceber padrões microbianos em tempo real, não apenas como uma resposta imune ou inflamatória, mas como um estímulo neural capaz de guiar o comportamento de forma imediata.
Para testar essa hipótese, os pesquisadores submeteram camundongos a jejum durante a noite e, em seguida, introduziram flagelina diretamente no cólon dos animais. O resultado foi que eles comeram menos do que o esperado. Quando a mesma experiência foi feita em camundongos geneticamente modificados para não possuírem o receptor TLR5, os animais se alimentaram normalmente e ganharam peso rapidamente. Isso sugere que esse canal de comunicação entre microrganismos e cérebro é fundamental para o surgimento da sensação de saciedade. Os cientistas chamaram esse mecanismo de “sentido neurobiótico”, que pode ser considerado o nosso sexto sentido. Ou talvez o sétimo. Ou oitavo. Já perdemos a conta.
É claro que o microbioma é um ambiente extremamente caótico e dinâmico, composto por cerca de 100 trilhões de células microbianas, cuja composição pode ser alterada por fatores como alimentação, estilo de vida e ambiente. O próximo passo dos cientistas será entender de que forma diferentes dietas afetam a composição do microbioma e quais são as consequências dessas alterações.
Segundo Bohórquez, esse trabalho pode ser especialmente útil para que a comunidade científica compreenda melhor como o comportamento humano é influenciado pelos microrganismos. Essa pode ser uma peça fundamental para desvendar condições como a obesidade ou transtornos psiquiátricos.