Quando os astrônomos observaram pela primeira vez a estrela MP Mus com o conjunto de radiotelescópios do Atacama, no Chile, conhecido como ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), tudo indicava que estavam diante de uma estrela jovem envolta por um disco protoplanetário aparentemente uniforme e sem sinais de planetas. Contudo, uma nova observação feita em 2023, com o uso de comprimentos de onda mais longos, revelou estruturas antes invisíveis: um anel e uma lacuna próximas da estrela, sugerindo que MP Mus, situada a cerca de 114 anos-luz da Terra, pode não estar tão solitária quanto se imaginava.
Liderada pelo astrônomo Álvaro Ribas, a equipe internacional de pesquisadores utilizou dados obtidos pelo ALMA e pelo satélite europeu Gaia para identificar o que pode ser um planeta gigante gasoso, com massa estimada entre três e dez vezes a de Júpiter, orbitando a estrela. A presença desse corpo foi sugerida por um leve “balanço” detectado no movimento da estrela por meio dos dados de Gaia, indicando a influência gravitacional de um objeto em órbita.
As observações com o ALMA mostraram que, em comprimentos de onda de 3 milímetros, mais profundos que os usados anteriormente, foi possível detectar cavidades e fendas no disco de gás, poeira e gelo que envolve MP Mus. Esse tipo de estrutura geralmente surge quando planetas em formação começam a abrir caminhos em meio ao material ao redor, como sulcos em um disco de vinil.
A descoberta é relevante não apenas por representar a primeira vez em que um exoplaneta foi detectado indiretamente dentro de um disco protoplanetário usando a combinação dos dados de Gaia e ALMA, mas também por sugerir que muitos outros planetas jovens ainda podem estar ocultos em discos semelhantes. Esse tipo de detecção é raro devido à dificuldade de observação, já que o gás e a poeira interferem na visibilidade dos planetas em formação. Até o momento, há apenas três detecções confirmadas de planetas jovens inseridos nesses discos.
Os pesquisadores simularam, com modelos computacionais, a possível órbita do planeta e estimaram que ele se encontra entre uma e três unidades astronômicas da estrela — ou seja, entre cerca de 150 milhões e 450 milhões de quilômetros de distância, o que corresponde a entre uma e três vezes a distância entre a Terra e o Sol.
No Brasil, a pesquisa de exoplanetas ainda enfrenta limitações de infraestrutura, mas centros como o Observatório Nacional (ON) e o Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), com sede em Minas Gerais, têm se envolvido em colaborações internacionais com o uso de dados de missões como Gaia e observatórios como o ALMA. A descoberta de um planeta desse porte em estágio tão inicial de formação serve de referência para projetos futuros, inclusive na preparação de instrumentos nacionais e regionais que venham a integrar redes globais de observação.
Com os planos de modernização do ALMA e a expectativa de novos equipamentos, como o ngVLA (next-generation Very Large Array), os astrônomos esperam aprofundar as investigações sobre a origem dos sistemas planetários, inclusive sobre os processos que levaram à formação do Sistema Solar e, eventualmente, da Terra. A identificação de planetas jovens ocultos em discos protoplanetários pode lançar nova luz sobre os estágios iniciais da evolução planetária, algo que as futuras gerações de telescópios devem explorar com mais detalhes.