Cientistas estão recorrendo à inteligência artificial para decifrar os sons emitidos por golfinhos, em uma iniciativa que pode alterar profundamente a maneira como a humanidade se relaciona com o mundo natural. Drew Purves, responsável pela área de natureza da Google DeepMind, afirma que há a possibilidade de, um dia, conseguirmos nos comunicar com animais.
Essa hipótese está sendo explorada por meio do DolphinGemma, um modelo de linguagem desenvolvido pela DeepMind que utiliza registros sonoros de golfinhos para auxiliar pesquisadores a compreender os padrões de comunicação da espécie.. A proposta é analisar os sinais acústicos usados pelos golfinhos e, futuramente, gerar respostas sonoras com base nesses padrões.
Segundo Purves, o sistema atua separando os sons, transformando-os em tokens e convertendo-os em estruturas semelhantes às utilizadas em modelos de linguagem de IA. Para ele, esse tipo de abordagem representa um avanço na forma como os cientistas estudam a comunicação animal, permitindo níveis de detalhamento que não eram possíveis anteriormente.
A expectativa é de que iniciativas como essa contribuam para uma transformação mais ampla na maneira como os humanos percebem e interagem com o restante da vida no planeta. Purves afirma que grande parte dos esforços atuais está voltada para preencher lacunas de conhecimento já identificadas, mas acredita que descobertas inesperadas podem gerar mudanças rápidas e profundas na relação entre pessoas e natureza.
Desde 2017, o Earth Species Project, organização sem fins lucrativos, também trabalha com o uso de IA para interpretar formas de comunicação de espécies não humanas. O principal sistema desenvolvido pelo grupo é o NatureLM-audio, apresentado como o primeiro modelo de linguagem de áudio em larga escala voltado exclusivamente para sons de animais. A ferramenta tem como objetivo ajudar cientistas a identificar espécies, classificar seus sons e até reconhecer vocalizações de espécies ainda não documentadas.
Em uma conferência realizada pelo Axios no ano passado, a cofundadora e CEO do Earth Species Project, Katie Zacarian, relatou que há indícios de que espécies como elefantes, papagaios-cinzentos e saguis já utilizam sons específicos para se referir individualmente uns aos outros — algo semelhante a nomes próprios.
A proposta do projeto é usar a tecnologia como forma de promover uma reconexão entre os seres humanos e a diversidade da vida no planeta, fugindo de abordagens que reforcem práticas de exploração ou dominação da natureza. Zacarian defende que o propósito não é ampliar os desequilíbrios já existentes, mas sim favorecer condições para que todas as espécies possam coexistir.
Aza Raskin, também cofundador do projeto, declarou que ferramentas desse tipo podem alterar a forma como a humanidade se enxerga. Ele comparou o possível impacto à mudança de paradigma ocorrida quando se descobriu que a Terra não ocupava o centro do universo. Para Raskin, o uso da IA na interpretação da comunicação animal pode redefinir o lugar da espécie humana dentro do reino animal.
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