Para a maioria dos cientistas, a consciência e o cérebro estão intrinsecamente ligados – e com razão. O cérebro é o centro sináptico onde nosso ser biológico interpreta o mundo ao nosso redor. Mas essa abordagem explica apenas certos aspectos da consciência, como o processamento de informações e o armazenamento de memórias. O “problema difícil”, como definido pelo filósofo e cientista cognitivo australiano David Chalmers, consiste em explicar por que esses processos físicos no cérebro dão origem à experiência subjetiva.
Este é de fato um problema complexo, que filósofos, teólogos, neurocientistas e biólogos vêm ponderando há milênios. Como o conhecimento abomina o vácuo, muitas teorias da consciência surgiram para preencher essa lacuna. Algumas chegaram a explorar a ideia altamente controversa da consciência não-local – ou seja, uma consciência que existiria além dos limites físicos de nosso crânio. Isso pode parecer contraintuitivo em relação à nossa experiência cotidiana, que parece muito interna. Mas, há anos, alguns pesquisadores analisam o fenômeno intrigante da experiência extracorpórea (EEC) como possível evidência para essa teoria controversa.
Seja induzida em momentos de grande calma ou calamidade, as EECs descrevem basicamente a sensação de a consciência de uma pessoa ser temporariamente deslocada espacialmente do corpo. Um novo estudo, publicado no mês argumenta que a experiência subjetiva de quem vivenciou EECs deve ser considerada ao explorar ideias relacionadas ao problema difícil da consciência.
“Argumentamos que essas experiências devem ser descritas como se apresentam à consciência, sem recorrer a pressupostos teóricos ou explicações causais externas”, escreveram os autores. “Preencher essa lacuna é crucial para alcançar uma compreensão mais profunda do fenômeno. Isso é essencial por duas razões principais: primeiro, para compreender a natureza da consciência humana e, segundo, para ajudar a normalizar essas experiências para os indivíduos que as vivenciam.”
Neste estudo muito pequeno, os autores entrevistaram 10 participantes que vivenciaram EECs em diversos contextos. A maioria descreveu a experiência usando termos como “outro plano de existência” ou “consciência universal”, o que os autores observam estar alinhado com descrições teóricas da consciência não-local.
No entanto, os cientistas também têm explicações menos controversas sobre o que ocorre em nossa mente quando vivenciamos EECs. Por exemplo, um estudo de 2023 analisou nove pacientes com epilepsia que tinham eletrodos cerebrais (originalmente inseridos para outros fins). Com sua permissão, os cientistas tentaram localizar a área do cérebro que parecia mais afetada durante experiências extracorpóreas, apontando para o pré-cuneus anterior – uma região cerebral associada a informações somatossensoriais (relacionadas ao corpo).
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